MONÓLOGO DO MORTO VIVO

Nunca estive

Na sala principal

Da vida dos outros.

Sou destes

Que não ultrapassam

O quintal, que tem reticências

E cerimônias,

Que nunca quer

Ou espera nada.

Como poderia ser diferente?

Que diferença poderia

Fazer para mim  o mundo?

Já estou cheio de mundos

E nenhum deles encontra canto

No  espaço infinito da realidade.

Melhor deixar a vida

Sair por ai.

Talvez um dia

Ela volte

Livre de todos os mundos...

ENCONTROS COM A MORTE E CONSCIÊNCIA DA FINITUDE

Ao longo da vida vivi alguns encontros com a morte. Como todo mundo, perdi pessoas, perdi o que elas eram dentro de mim mesmo,  aumentando o peso dos passados que levo nas costas. Mas também aprendi a conviver com meus  silêncios, com meus inconformismos e lamentos diante da obvia, concreta e incontestável finitude humana.

Ao longo da vida, eu aprendi a ser perene e provisório como a soma de todas as tantas coisas que me definem a consciência do mundo

BANALIDADE

Tentei reter a vida
Entre os dedos do tempo,
Parar a paisagem,
Acalmar à tarde.
Não pensar no tanto
De passado
Em que me transformo
A cada segundo.
Mas tudo continua passando,
Correndo,
De encontro ao nada
De um amanhã de silencio.

O TEMPO QUE FALTA

Falta-nos tempo
Para viver,
Para dar importância
As pessoas e coisas
Que em nossas
Intimas paisagens
Habitam perenemente.
Falta-nos tempo...
E, ironicamente,
Temos todo tempo
Do mundo.
O que nos falta
Sempre
É na verdade
A própria vida
Contra o concreto
Da existência.

AFORISMAS SOBRE O DILEMA DE TODOS OS DIAS

A grande arte da vida é inventar cotidianamente  a realidade como se o viver entre os outros fosse algo mais do que esquizofrenia e hipocrisia compartilhada no caos de identidades e codificações do real.
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As vezes não há nada a fazer.
Apenas esperar estar vivo
Quando o dia acabar.

A FRAGILIDADE DO FUTURO

O futuro
É tudo aquilo
Que você quer
E espera,
Não necessariamente
O que você terá
Em qualquer perdido
E indefinido dia
De amanhãs desfeitos...

AS MORTES EM MEUS VAZIOS

Esqueci um pouco da vida,
Abandonei o pensamento
Em casa
E sai por ai sem destino,
Sem buscar
Ou querer
Qualquer coisa.
Segui  em silêncio
Inteiramente vazio
Metamorfoseado
Em variantes de mortes
E rupturas internas
Que me aproximam
Demasiadamente
Das ausências de minha
Precária existência.

MORTE CEREBRAL

O silêncio é cerebral,
Físico,
Químico
E natural.
O cadáver o personifica,
Lembrando a todos
Que nunca teremos
De nós mesmos
O olhar mais radical.
Ser em si mesmo
É estar morto,
Inerte em objetividade...

MÁ NOTÍCIA

Uma tristeza de morte
Abateu o dia,
Apagou o sol
E o céu,
Ofuscando o chão.
Tudo de repente fugiu
Ao controle,
A imaginação e aos fatos.

Abatido  por uma
Noticia triste
Deixei o tempo
Cair dos olhos.

APENAS A MORTE MUDA REALMENTE AS COISAS...

Normalmente buscamos tudo aquilo que associamos a bem estar e sucesso. Como se a existência humana comportasse a realização bisonha de qualquer  ideal tosco de felicidade. Mas a verdade é que não importa o quanto você realizará na vida, nunca estará satisfeito, nunca se sentira completo, ou vislumbrará o melhor dos mundos possíveis.
Acredite: existir não é um passeio em um parque de diversões. Existir é aquilo com que ninguém se conforma mas , de modo algum, quer abrir mão. Afinal, sabemos instintivamente que é melhor viver em permanente insatisfação, do que simplesmente estar morto e sem preocupação alguma.    
A vida é o que é e você nunca vai mudar isso...
Apenas a morte muda às coisas.

MORTE DA ARTE

Tudo aquilo que pode ser destruído me dá vida.

O tempo é a  suprema experiência de destruição

Que nos desfaz qualquer possibilidade

De criação e futuro,

É a mais profunda piada

Que se insurge

Contra qualquer ideia de amanhã  universal....

Rimos de nossa própria liberdade,

Das misérias de nossas individualidades,

Decompondo todo bom ideal de realidade...