quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

SOBRE O MEDO DA VIDA NO RÉVEILLON

Não tenho medo da morte. Tenho medo da vida podre que todos os dias  desaba sobre o vazio de nossos egos.
Tenho medo das convenções sociais, da mínima morada d do meu ser precário, que se desfaz nos anos se refazendo sempre como esquecimento de si e dos outros.

Não há ano novo.
Não existe ao novo.
Os anos não existem!

sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

PARADOXO MORTAL

O tempo passa,
As coisas mudam,
As pessoas morrem
Mas, estranhamente,
O tempo que passa,
É o único que permanece
No desaparecimento de tudo.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

DEPOIS DO LUTO

Superado o luto
Fica a saudade,
Ou qualquer estado de perplexidade,
Que a memória escreve no tempo.
Fica para sempre preso na garganta
Um grito cego e agudo
Contra o absurdo da própria existência.


FIM DE ANO (2020)



A Terra gira.
O ano acabou.
Já não há vestígio
Do brilho incerto dos seus dias.
Ficou apenas um gosto de morte,
Na memória de coisas perdidas,
Nas despedidas,
Que o tempo organizou
Na contramão da vida.

O agora é feito de incertezas.
Nada é definitivo,
Seguro ou inequívoco.

O ano acabou
E não vejo nas estrelas no céu
O desenho de qualquer outro dia.

Sei apenas que a terra gira 
 E que o passado grita
Nossos amanhãs perdidos. 

quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

AOS MEUS SOBREVIVENTES

 

Quando eu for apenas uma opaca lembrança na memória de poucos, espero que me façam justiça. Que não me lembrem pelos seus julgamentos, opiniões ou impressões subjetivas. Espero que tenham em mente o eco da minha voz, meu dizer imprudente sem o efeito de suas interpretações. Espero que não me convertam em morte em uma caricatura tosca de quem fui um dia.

Ingênua esperança essa a minha. Como poderiam fazer justiça a minha memória se todos tão pouco me conhecem. Ninguém sabe dos meus pensamentos e angustias mais intimas. Ninguém compartilha suficientemente da minha intimidade para dizer que tipo de farrapo humano eu fui neste mundo de anônimos. Ninguém me faria justiça.

É melhor ser esquecido de que mau lembrado!

NULIDADE EXISTENCIAL

 


 

Não me lembro do dia do meu nascimento.

Considero, alias, a data desimportante

e tão insignificante quanto o futuro dia da minha morte.


Existir ou não existir pouco me importa.

A indiferença da natureza que me fez corpo

me ensinou o desvalor das coisas.


Hoje se aqui sou palavra,

amanhã serei silêncio

que não cabe se quer no esquecimento universal

de todas as coisas que passam.


sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

DÚVIDA

Não  sei mais a fronteira entre o mundo dos vivos e dos mortos.
Surpreendo-me fora de tudo
enquanto respiro.
 
Quase não  sei se existo...
Só me resta ascender mais um cigarro,
antes de anoitecer.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

A GUERRA COMO METÁFORA

O mundo está em guerra.
Mas não há guerra,
Apenas um oceano de mortos,
Estados falidos e demagogos,
Em meio a perplexos cientistas
Soterrados pelas ruínas da civilização.

Os inimigos são invisíveis,
Mas nós somos nossos maiores adversários.
Ninguém sairá vitorioso.

Não há guerra.
Viva a guerra!
A paz é uma alucinação
E a vida um espetáculo de destruição.



terça-feira, 8 de dezembro de 2020

DA FINITUDE

 

Quanto mais incerto o dia seguinte,

mais intensa me parece a vida.



Quanto mais efêmera a experiência de ser,

mais acorda em mim o desejo de viver.



Afinal, findar-se é uma arte

que nos acontece a vida inteira,

  significamos o tempo

  no ontológico desabrigo 

de nossa existência imperfeita.

A VIDA COMO ERRO

 

Ser carne, osso, sangue,

e extensão,

provisoriamente,

sabendo o mundo,

não me entusiasma.


Pouco me importa

participar do coletivo delírio

que chamam de vida.


Vida é coisa vaga,

um erro da natureza

que a morte corrige.



segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

EU E O TEMPO

 

Hoje  terei tempo

para gastar com o tempo.

que sempre me falta.


Tudo é sempre uma questão de tempo.

Tempo que quanto mais tenho

menos me resta.


Amanhã será sempre tempo

dentro do tempo

e através do tempo 

que sempre me falta.

 

Depois que eu for esquecido,

haverá apenas o tempo.



COMEÇANDO A MORRER

 

Ontem foi o primeiro dia

do fim de todos os meus dias.

Assim decretei com um suspiro,

um aperto no peito,

na saudade de todos os meus passados.


Percebi, repentinamente,

que eu já não era mais,

que tudo já tinha sido.


domingo, 6 de dezembro de 2020

PENSANDO NA MORTE

Morro aos poucos todos os dias. Seja através dos atos ou dos pensamentos, no tempo que desgasta o corpo, ou, simplesmente, através da morte dos outros. 
Mas sei que morrer definitivamente, no imprevisível de qualquer dia  não realizará em mim a morte que eu queria ou esperava.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

PRECARIEDADE

 

A precariedade é o traço saliente de qualquer existência. Pois existir é um estado permanente de necessidade, de buscas. Isso nos obriga a estar sempre em movimento, engajados na manutenção de um equilíbrio incerto entre o eu e o mundo onde nenhum dos dois polos permanece o mesmo. A existência é um estado de incerteza, de angustia, no encadeamento dos instantes onde as palavras e os enunciados nos inventam.

Atribuímos um sentido e um sentimento a toda experiência possível de um real histórica e socialmente estabelecido, mas de modo algum este real esgota nossa realidade. A mudança está em tudo aquilo que nos escapa, que foge ao jogo da consciência e nos desafia a reinvenções e rearranjos constantes. Somos precários porque tudo que nos compõe interna e externamente está constantemente perecendo, mudando, e se refazendo. A precariedade se confunde com tal instabilidade ontológica a qual estamos todos condenados. Mas raramente nos damos conta de nossa precariedade.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

INFINITOS

 

Há infinitos em mim

que no sem fim da extensão

simplesmente não existem.

Só eu sei deles

no não ser que me habita

entre o sono e a morte.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

DESABAFO PÓS EXISTENCIAL

 

Pouco importa se eu existo,

se respiro ou aconteço no mundo.

Não interessa meu tanto dizer o mundo.


Estamos todos sozinhos

em um grande cemitério

de corpos vivos.


Ninguém se importa,

ninguém vive...

ninguém  escuta



terça-feira, 1 de dezembro de 2020

A VIDA COMO ABORRECIMENTO

 

Estar vivo ou morto já não me faz qualquer diferença.

Pois se, enquanto vivo, sou criação e ato, morto sou pura liberdade.

De ambos os modos questiono toda forma possível de ser e viver.

A existência me aborrece. Definitivamente ela me aborrece demasiadamente!

Todas as metas, propósitos, possíveis significados, ou

prazeres que traduzem a vida comum, são para mim apenas fastio,

uma unitilidade absoluta contra a qual o universo existe.

Não busco qualquer coisa, apenas sigo naufrago no tempo

até o fim dos meus dias.