terça-feira, 30 de novembro de 2021

A LIBERDADE DOS MORTOS

Os mortos estão livres do bem e do mal,
desconhecem a ilusão  da alegria e da tristeza,
não são movidos pela necessidade e pelo desejo.
Os mortos são  livres de si mesmos.
A liberdade é a meta verdade dos mortos
e a prisão dos vivos.

quarta-feira, 24 de novembro de 2021

NADIFICAÇÃO DA EXISTÊNCIA

Sua vida, meu amigo,
não passa de um cisco
na abstrata humanidade
decantada nos livros.

Ela é um nada,
um instante triste,
sem lugar no vazio da eternidade. 

Todos os dias 
alguém nasce,
morre,
e não faz diferença. 

Sua vida, meu amigo,
mal existe
no acontecer biológico da espécie. 

A vida é aquilo que foge,
e o corpo é um composto
de nadificação,
um exercicio lírico de finitude.

quarta-feira, 17 de novembro de 2021

O NADA COMO FUNDAMENTO DE TUDO

No NADA cabem todas as coisas.
Mesmo que despidas do brilho da signifição
e privadas de qualquer valor de uso ou de troca.

Nele o mundo des-existe como sucata, ruína acumulada em imanência e entropia das significações,
como um estado perpétuo de silêncio da existência 
no crepúsculo da humanidade
soterrada pelo acúmulo de tanto passado no teatro das representações.

O NADA é uma metáfora da morte que preenche o vazio
com a presença absoluta da ausência de tudo que foi e será.


terça-feira, 16 de novembro de 2021

A ÉTICA DO MAL VIVER

Viver é sofrer
pequenos e grandes
desastres.

Existir é arruinar-se,
construir na ética
dos encontros
seu próprio desaparecimento
como catarse.

segunda-feira, 15 de novembro de 2021

VONTADE DE NADA

Há sempre uma vontade de ir embora,
de seguir em frente,
de fugir dos dias,
ou inventar outro canto,
uma alternativa de existência. 

Não importa o que a gente conquista,
as identidades que nos vestem,
nunca nada  é suficiente.
Há sempre o desejo de desaparecer de si mesmo.

É sempre a mesma agonia,
aquele limite do corpo e do mundo,
contra a vontade de ermo e infinito
de nossas asas ausentes.

BOA MORTE

Quando a vida se reduz a lembranças,  morrer é se mudar para o passado para habitar o esquecimento e desfazer-se em memórias, quando o futuro já não importa.

A VIDA CONTRA A EXISTÊNCIA

O corpo é mundo,
desejo e criação,
composição quase infinita
de coisas.

Mas a vida
é algo que  falta
a existência, 
é uma ausência que nos preenche e incomoda.

A vida
não é humana.
É natureza que foge,
um apetite que nos devora.

A vida é inimiga da existência,
um estado negativo do corpo,
uma expressão positiva do nada .



sábado, 13 de novembro de 2021

MORTE SUBVERSIVA

Morrerei de repente
abraçado num vento
sem direito a qualquer lamento.

Morrerei como antigamente,
sem lenço e sem documento.

Joguem no mar meu cadáver
em uma noite qualquer
de violenta tempestade.

Não  deixem meu nome virar silêncio,
lutem por liberdade.


FINITUDE

O tempo incompleto de nossas vidas 
segue incerto e aberto
pelas noites e dias
do andar do mundo.

Em algum momento
seremos extintos,
ultrapassados pelas crianças
que reinventam o hoje.

Mas, por enquanto, 
alguma vontade busca,
através de nós,
alcançar o sublime
de um instante de eternidade.

Nosso tempo
ainda é selvagem
no intenso presente
que nos transforma,
e as horas seguem abertas
em oportunidade.

Mas o tempo sempre nos falta
pois a vida é maior que o instante que resta.

quarta-feira, 10 de novembro de 2021

O ÚLTIMO ALMOÇO

O fim do mundo agora
frequenta a mesa do almoço 
sem cerimônias.
Toma acento entre nós 
como um amigo antigo,
íntimo de nossas angustias mais cotidianas.

Fala mal do planeta 
e amaldiçoa nossa hipócrita
defesa da vida
em nome de um progresso predatório.

O fim do mundo tem a face horrenda do novo capitalismo.
Promete o encanto de novas tecnologias
contra nossas desesperanças
e certezas de morte da vida.

A banalidade do absurdo
é o prato servido frio na mesa do almoço
onde o fim do mundo é convidado de honra.



segunda-feira, 8 de novembro de 2021

REFEIÇÃO

A vida é servida mal passada,
um pouco crua e sem sal.
Agrada o paladar de poucos.
Mas, o que importa,
se é ela quem nos devora?
Somos todos o prato principal
no banquete  da existência. 


domingo, 7 de novembro de 2021

VIDA COMUM

Somos todos 
Historias entrelaçadas
de gerações de corpos
e paisagens
a deriva no tempo,
sonhando a sobrevivência
contra o trágico da finitude.

Dentro de mim todos os meus mortos vivem,
morrem comigo,
todos os dias,
indiferentes a um mundo
que segue,
através da natureza
que nos transcende
e esquece.



sábado, 6 de novembro de 2021

MORRA SEM ESPERANÇAS

É ridículo esperar futuro
depois da morte,
apostar na alma,
num eu eterno,
como se o universo 
fosse baseado na vida,
 em qualquer ordem 
 ou sentido humano das coisas.

SOBREVIVÊNCIA E CANSAÇO

Farto de sobreviver
soterrado por meus passados
aprendi a sonhar com a morte
como fim de todos os meus cansaços.
Minha vida já foi tudo que podia ser.

MORTE INVISÍVEL

O mágico espetáculo da decomposição dos corpos no cemitério é invisivel aos vivos.
Ninguém suportaria a consciência da morte, ou a imaginação dos suicidas.
Por isso o essencial é sempre escondido, para que ninguém leve a morte as suas últimas consequências. 


quinta-feira, 4 de novembro de 2021

AS MARGENS DO FUTURO

Cada um de nós 
há de desaparecer
antes da chegada do futuro.
Futuro que é sempre outro,
ignorando os anos,
o amanhã e a vida,
nas tempestades dos sonhos.
Mas ultrapassamos o futuro
através da morte.

ERA UMA VEZ UM CÉTICO

 Cansado de ver o tempo arruinar a vida,

 jogou a existência na lata de lixo de um cemitério.

 Perdeu-se do mundo para preserva-se de si mesmo

 no sem rosto do devir biológico.

Não deixou vestígios,

não fez diferença. 

 

quarta-feira, 3 de novembro de 2021

DESVIVENDO

Hoje a vida cansa,
desbota,
enlutada,
encolhida em qualquer canto,
temendo o tempo
que nos mata.

A vida sangra,
sem esperança,
e desvivemos esgotados
antes do amanhecer.