PARADOXO EXISTÊNCIAL

A morte tornou-se 

nossa poesia,

nossa raiva, 

nossa vingança,

nossa fuga, 

nossa vitória possível

sobre a vida.

Ela é a resposta a nossa impotência,

frustrações, carências e decepções.

A MORTE COMO SENTIDO DA VIDA

Nunca seremos felizes,

a vida jamais será perfeita.

Conheceremos todos os nossos limites.

Enfrentaremos doenças,

  mortes e  silêncios.

Tudo em nome da sobrevivência.

Aprenderemos, com os anos,

e através de amargas experiências,

o quanto a  vida não faz   sentido

  e a existência é uma experiência inútil.

Somos apenas um corpo que envelhece,

que experimentando o tempo

sofre sua lenta e fatal  decadência.

O CORPO ENQUANTO LUGAR

Meu corpo é um lugar frágil,

perecível e incerto.

Seus atos, sua voz,

suas necessidades, 

o definem na paisagem,

mas não na natureza

que inutilmente tenta superar.

Meu corpo inventa seu próprio e inquieto bem estar,

cria artifícios, instrumentos e silêncios 

transformado-se enquanto lugar.

Meu corpo nunca sabe exatamente onde está....

nem mesmo percebe que é apenas um lugar.

O CONTRARIO DA VIDA

O contrário da vida,

 não é a morte.

É permanecer sempre o mesmo,

imune as novidades,

indiferente ao passar dos dias,

dos anos,

sobrevivendo aos labirintos da própria sorte.

O contrário da vida é a estagnação e a  inércia,

é o conservadorismo,

a incapacidade de ser outro.

SILÊNCIO....

A vida é esta falta de sorte,

esta ansiedade de abismos,

que embriaga suicidas

e alimenta filósofos.

A vida é um corpo cansado,

com fome e estressado.

Ela é o limite entre o possível 

e o desejado.

Depois, silêncio,

 um vazio abstrato...

CATÁSTROFE

Antes havia tempo

para o progresso,

para ciência

e para o futuro

da humanidade.

Acreditávamos na civilização 

 na história, na razão,

na vida e na prosperidade.

Agora há apenas 

a iminente catástrofe,

nosso grande e inevitável desastre.

É tarde demais para o amanhã,

para o futuro da humanidade.

 

OS MORTOS ESTÃO MORTOS

Desistam da metafísica,

das ilusões religiosas.

Os mortos não estão apenas ausentes.

Não gozam de eternidade.

Os mortos estão mortos, 

definitiva e irreversivelmente mortos.

Isso define o tempo, o mundo e a gente.

Os mortos estão mortos

e isso é para sempre.

ENTRE MORTOS

Carrego comigo

alguns mortos queridos

que definiram quem eu fui em vida.

Quando eu morrer vou me desfazer

na lembrança deles,

desaparecer em nosso passado comum.

CONTRA A EXISTÊNCIA

Tudo que vivi e que sou

morrerá comigo

sem deixar herança 

ou lembrança.

Um dia será 

como se eu nunca

houvesse existido.

Mas a inexistência 

é a melhor coisa do mundo e,

admito, gostaria de nunca ter nascido.

ILUSÕES HUMANAS

Todo mundo se acha importante

até vislumbrar, moribundo,

 sua irrelevância

diante de tudo que passa.

Sabemos que nada é para sempre,

que a vida acaba em esquecimento,

que tudo que amamos,

 absolutamente  não importa,

que não passamos de um  efêmero e inutil momento de matéria orgânica.

Vivemos, entretanto, 

 como se fossemos eternos, 

o centro do universo,

 herdeiros de deuses antigos e contemporâneos.

Definitivamente, nada é mais ridículo,

 do que nossa pretensiosa

 condição humana.

ÚLTIMO ANIVERSÁRIO

Meus mortos dizem meus anos,

minha finitude, meus limites.

Pois meu tempo é memória,

saudade e abismo.

Amanhã estarei morto.

Não haverá ano novo.

Só um quarto vazio

é um passado perdido.

A velhice é um estorvo.

CORPO E IDENTIDADE

Sou um corpo

cheio de necessidades,

potências e prazeres.

Um corpo que muda,

que envelhece e resiste

contra o tempo que passa.

Um corpo ancestral,

descolonial e pós histórico.

Um corpo único e pessoal

que desaparece aos poucos

entre tantos outros dentro da multidão.

A morte, afinal, é o segredo do corpo.

MEU ÚLTIMO INSTANTE

Meu último instante

 há de coroar 

a insignificância de uma vida inteira. 

 Será efêmero e ilegivel,

 indigno de qualquer lembrança. 

 Meu último instante 

será, apenas, silêncio.

PASSADO PERDIDO

Talvez, a vida

seja um passado

que ainda não foi esquecido.

Apenas isso.

O tempo é a morte

que transforma o espaço 

inventando  ausências.

Tudo é mudança,

perda, e, por fim,

esquecimento.

Talvez, a vida seja,

desde sempre,

um passado perdido

já que o amanhã  

nunca será para sempre.

SATÃ COROADO DE FLORES

Satã coroado de flores

anuncia orgias e primaveras,

colheitas, gozos e festas.

Satã coroado de flores

aguarda por todos

no interior da floresta.

Pois sabe

que a vida é intensa 

onde a morte é certa.

MORTE E GEOGRAFIA

Passamos a considerar uma profunda melancolia em toda geografia quando percebemos que os lugares morrem. Mas eles morrem de um modo onde é a presença que remete a ausência. O tempo mata todos os lugares e, entretanto, eles continuam ali, imponentes, contra seu próprio passado e na contramão da história.

DA INCONSISTÊNCIA DE SER

Sou o passado que morrerá comigo,

as pessoas que perdi,

os momentos que esqueci,

e a ilusão de um encadeamento linear dos fatos

onde tudo é aleatória descontinuidade.

Sou onde tudo foge,

onde a vida escapa,

onde perto é longe.

Carrego muitas lembranças 

que jamais se tornarão memórias

na desconstrução da História.

DEPOIS QUE VOCÊ MORREU

O passado nunca mais foi o mesmo

depois que você morreu.

Parte de mim, então, se perdeu no tempo,

desapareceu afogada em lembranças e desesperanças.

Tudo que o mundo poderia ser

morreu com você.

O que sobrou de mim 

não sustenta um amanhã

ou a potência de qualquer querer.

AOS POUCOS MORREMOS

O céu lá fora

 não cabe nos olhos

enquanto o tempo passa 

contra a paisagem.

Agora é quase por do sol....

Aos poucos morremos 

e não há nada que possa ser feito

sobre isso.

A vida é um erro que não  tem concerto

e o céu lá fora nunca é o mesmo.

A vida não cabe no agora,

no céu, na paisagem ou nos olhos.

Aos poucos morremos...

e é só isso.

Viver é um inútil exercício de si,

do mundo e dos outros.

UM DIA NÃO SEREI MAIS NADA

Um dia não serei mais nada.

Estarei banido do tempo e do espaço

enterrado em algum  perdido e esquecido passado.

Um dia vou sumir no silêncio.

deixando um futuro pendente.

Terei , então, um grande vazio

pela frente.

Ninguém encontrará meu rastro.

Um dia não serei mais nada....

a existência é uma falsa massada.

MALDITO DESAJUSTADO

Espero jamais ser castrado,

mutilado, domesticado, assimilado,

transformado em boa  referência

e em  um cidadão produtivo, amado

e respeitável.

Espero não acabar bem quisto pela polícia,

pela igreja e pelo Estado.

Prefiro morrer odiado e marginalizado.

Nunca ser reverenciado.

mas sempre lembrado como um maldito desajustado.

 Foto: Adeodato Ramos. Líder da "guerra do contestado" tido como o próprio diabo.

APOLOGIA A FINITUDE

Gosto da ideia de desaparecer,

escapar a prisão de ser,

superar toda necessidade e querer.

Afinal, a nada nos leva a vida.

Felizmente iremos todos morrer

 antes do fim do mundo,

do esquecimento absoluto.

NEGAÇÃO

Tudo morre,

tudo é tempo

e o mundo é incerto.

Mas o nada transcende 

nosso entendimento.

Vivemos como se tudo 

fosse eterno,

imaginando deuses

e infernos.

TER, SER E MORRER

Temos um trabalho

pra ter um salário 

e sobreviver até o mês seguinte.

Temos uma casa, família,

certezas

e algumas memórias

a nos dizer quem somos

através dos anos 

Temos hábitos e rotinas

que nos devoram,

 vontades loucas que nos roubam o juízo,

alguns sonhos e filhos 

Mas um dia, sem aviso prévio ou cerimônia, tudo acaba.

A morte nos tira tudo, nos reduz a nada,

enquanto a vida continua e tudo segue sempre por um fio.

ANTES E ATRAVÉS DE NÓS

Antes de nós 

outros andavam por aqui

e o mundo não era o mesmo.

Antes de nós

 a realidade era outra.

A vida é sempre  outra coisa

enquanto se desfaz

antes, depois e através de nós.

MORTE E SILÊNCIO

Há mortos que não são lembrados

porque aqueles que os amavam 

também já estão mortos.

Nada resiste ao tempo.

Um dia  tudo será silêncio

e todos estarão mortos.

MATERIALISMO E PRAGMATISMO

Prefiro lidar com a realidade

sem fantasias metafísicas

que me negam o corpo

e mistificam a vida.

Vivo sem deuses,

destinos e alma.

O mundo, afinal, 

é sempre um aqui e agora.

Depois nada.

E isso é tudo que me inspira

e importa.

O TEMPO, A CASA E A MORTE

Só me importa ficar em casa

sem fazer nada

vendo o tempo que passa.

Saber os dias e noites

e mais nada.

Só me importa o tempo

 e a casa

e a morte que nos abriga

e ultrapassa.

A VIDA CONTINUA ENQUANTO A GENTE MORRE

A vida não serve pra nada.

Não está presa a qualquer propósito.

 É  coisa inútil,  sem sentido,

sem alma.

A vida é a vida enquanto pode.

Pois tudo morre...

A vida continua enquanto a gente morre.

.

DO SOFISMA AO SIMULACRO

Cansado de vomitar verdades

passou a embriagar-se com mentiras.

Aprendeu a duvidar da realidade,

tornou-se um franco niilista.

Descobriu que a vida é algo que escapa,

que foge, que falta,

que termina em um precipício.

Superou a ilusão do verdadeiro e do falso,

a autoridade dos letrados e magistrados.

Percebeu que tudo era simulacro e artifício.

TUDO QUE SOMOS É CORPO

O corpo é tudo que somos.

O que nos faz "humanos"

através de um sistema nervoso.

A consciência é parte do corpo.

Não sua essência.

Pois não existe boa consciência 

sem um corpo que bem funciona.

A MORTE DE ALGUÉM

A morte quebra a rotina, 

o tempo e o mundo, 

quando nos priva de alguém.

 Ela abre um buraco, 

Inaugura um silêncio, 

que vai doer para sempre. 

 Pois, a morte do outro

 mata um pouco da gente,

 diminui o futuro 

e aumenta o passado.

VIVER É APRENDER A MORRER

O essencial é sempre o que morre,

o que se afasta,

o que se perde,

pois a vida é a presença 

de uma constante ausência 

que nos devora.

A vida, em outras e poucas palavras,

 é um aprendizado de morte.

Um silêncio...

A VIDA É A EXPERIÊNCIA DA AUSÊNCIA

A vida é o que passa,

é o que está lá fora,

o que vai embora.

A vida é o que falta.

É algo que habita

nossos silêncios

e ultrapassa nossa existência.

A vida é experiência da ausência.

TEMPOS MODERNOS

Sobrevivemos, provisóriamente, aos nossos passados, as nossas ausências e saudades.

Resistimos a falta de tempo, aos dias perdidos no trabalho, no ócio massificado e padronizado do  consumo desregrado.

Sofremos o tempo que nos aniquila dia após dia, sem piedade,

até que tudo se desfaça através de um 

um futuro que nos ultrapassa.

Assim, existimos l, mediocridade, como coisas mortas e civilizadas...

A VIDA É O ALÉM DO HUMANO

Para mim, por toda existência,

a vida foi qualquer coisa ausente 

e sem nome,

uma intuição, alucinação,

ou matéria de sonho 

Talvez, ainda, a antecipação 

de um futuro distante

onde os corpos,

nus e soberanos

terão superado

a ilusão do humano.

VIDA E MORTE

A vida  se perde

dia após dia.

É uma ausência que cresce,

um passado que engole futuros.

A vida é a morte que a gente carrega,

é o íntimo abismo que nos esclarece,

é seguir sempre sem rumo,

enquanto tudo perece.

HOSPITAL

O hospital é uma prisão 

onde o corpo é o centro de toda ação.

O hospital é um exílio,

onde o adoecimento é o que nos define

como objeto de cuidado e atenção.

O hospital é o não lugar da consciência 

que foge e atrofia,

é um espaço de disciplina,

onde o eu se perde no vazio de si mesmo

sem o chão da rotina. 

O FIM DOS MEUS DIAS

O fim dos meus dias

é um trabalho de vida inteira.

É uma rotina onde tudo

se tranforma em silêncio

e se rende ao esquecimento.

O fim dos meus dias

começa com meu nascimento

e antecipa o fim do mundo

que não muito longe já nos espera.

NA URGÊNCIA DA MORTE...

A vida passa no tempo que foge

e o mundo renasce na medida em que morre.

Nada é para sempre, tudo é efêmero,

insignificante.

A vida passa  na urgência da morte.

Tudo é como a paisagem que foge

pela janela de um trem que corre.

O MUNDO COMO OPRESSÃO E ANGÚSTIA

O mundo é um jogo de perguntas e respostas, um amontoado de discursos, enunciados e conceitos, que não deságuam em conclusões ou soluções, mas em indagações infinitas e emoções imprecisas.

O mundo é a angustia e o impulso quase suicida de quem  esta preso a uma consciência que se debate, que sofre um permanente embate com a  insólita, corriqueira  e provisória, experiência da existência.

O mundo é o que não tem resposta e se confunde com nossoscsaberes, incertezas e ignorâncias. Ele é  tudo aquilo que nos acontece enquanto a vida passa. É o que nos mantém sempre perplexos dentro de um ego que nos sufoca e lentamente mata.

O NÃO SENTIDO DA VIDA

Caso morresse hoje

não saberia dizer

o que me importa 

através da ilusão da vida.

Nada faria diferença 

depois que tudo

que fui um dia

virar fumaça

e a vida escapar

através da consciência,

da ciência 

e do vazio da minha mais íntima inexistência.

CADA EXISTÊNCIA

Cada existência é um pouco de nada

que nega o mundo,

que faz da natureza um aleatório jogo

sem objetivo.

Cada existência é um corpo

que provisóriamente sobrevive

contra o caos do universo

no ermo da Terra que nos abriga.

POEMA ANTI CLERICAL

Alguma coisa morta

ainda se move

dentro de nós

através de toda metafísica.

Alguma coisa fedida,

podre e sagrada

ainda nos define a consciência da vida

como um suposto fato além matéria,

do mundo e da alegria Dionísiaca.

Nada é mais repugnante

que esta ilusão divina 

que ainda sustenta o  poder de estado, papas, pompas e hipocrisias.

A ILUSÃO DA CONSCIÊNCIA

 A vida é a ilusão de que a gente importa,

 de que o mundo tem um propósito, 

e que fazemos a diferença

 através dos nossas ações.

A vida é estar aqui e agora

mergulhado no equívoco da consciência 

entorpecidos pela realidade objetiva

que nos devora o corpo.

O PASSAR DO TEMPO

De repente a realidade virou passado,

 ausência e lembrança. 

 A saudade engoliu o mundo

 que até a pouco nos abrigava,

 reduzindo a vida a deserto. 

 Tudo que agora nos resta

 são velhas imaginações de infância.

 Nossa existência não tem mais substância

 e tudo se perde em um assombroso silêncio.

TEMPO E EXISTÊNCIA

Minha existência é uma coleção 

de silêncios e ausências.

É um corpo que envelhece,

que se dobra ao tempo,

em um mundo que se transforma

e se torna sempre novo,

outro, contra todas as  espectativas.

Minha existência é a memória de um passado

cada vez mais distante e impossível.

É um vazio que consome a si mesmo,

É tudo que passa e o que ainda resiste

ao seu próprio absurdo.

TODO DIA É FIM DO MUNDO

Os lugares mudam, 

as pessoas morrem

 e a vida nunca é a mesma.

 Tudo é mutação e incerteza. 

Todo dia é fim do mundo 

para nossa alegria e para nossa tristeza.

A MORTE COMO ANTI PROJETO EXISTÊNCIAL

Alcançar o nada,

a unidade de tudo,

a diversidade absoluta,

o caos do ser e do não ser.

Torna-se inteiramente a morte

que todos os dias nasce um pouco

em todas as partes do corpo.

Eis o único propósito de viver.

O FUTURO COMO TEMPO MORTO

O futuro é um passado que não para de crescer.

É um nada que nos devora,

um vazio que nos apavora.

O futuro é o que nos escapa,

o que nos ultrapassa.

É nossa espectativa,

 nosso silêncio,

nossa inevitável derrota.

O futuro é o lado de fora do que hoje existe.

O IMPERATIVO DAS NECESSIDADES

As convicções alheias não afetam minhas certezas. 

Nem mesmo me interessam. 

Não quero fazer da realidade um instrumento das minhas verdades. 

 Sei que o mundo jamais se dobrará a minha vontade. 

 Longe de mim esperar que me deem razão em qualquer debate. 

Afinal, vida não é questão de opinião, 

mas de necessidade. 

 Somos todos feitos e movidos

pelas necessidades.

Quais são as suas necessidades?

ENTRE ATOS E FATOS

É sempre tarde,

sempre depois do fato.

Há  um permanente hiato

 entre o tempo e o atos.

É sempre depois da hora,

sempre a mesma história.

Tudo se impõe como imutável

enquanto o tempo nos joga fora

nos despindo dos acontecimentos.

LEMBRO SEMPRE DOS MORTOS

Lembro sempre dos mortos que me ensinaram a vida,

 dos lugares perdidos onde me inventei no mundo,

 sabendo que a morte é mais vasta do que a vida,

que desde sempre já estamos  mortos

e que toda eternidade cabe no raso de um único segundo.

O MUNDO ACONTECE

O mundo acontece

fora da minha existência

e inspira minha desobediência.

Sou corpo, ficção e experiência.

Mas tudo em mim é morte e imanência.

O mundo acontece

onde já não existo.

TEMPO, MORTE E SILÊNCIO

Minha ausência  transcende a lembrança.

 É o que não cabe, escapa e foge,

 enquanto minha existência implode no tempo. 

Ninguém percebe

que tudo desaparece,

que a morte é o próprio tempo

nos transformando em silêncio.

.

CONFISSÃO

Admito minhas angústias, 

enfermidades e incertezas.

Escrevo meus desesperos, 

minha frivolidade.

Mal digo minha sorte.

Registro meu desprezo pela vida,

 meu medo da morte.

Confesso toda minha agonia

e exponho todos os meus segredos

Afinal,nada disso  tem realidade

 fora do insignificante  arranjo de mim mesmo.

.

A VIDA IGNORA A SORTE

A vida não vale a sorte 

É coisa boba, tola,

destinada a morte.

A vida é só um suspiro.

Quase nada,

quase silêncio,

quase vazio.

A vida é sempre um quase,

uma plenitude impossível,

um permanente embate

entre a vontade e o determinismo.

Ela não é uma questão de sorte,

é sempre uma queda no abismo...

A CASA

A casa não cabe

entre suas quatro paredes.

Ela é em suas  janelas e portas

um lado de fora.

Ela existe através do vento,

do sol, vozes e movimento.

A casa é a vida no corpo de quem mora.

Habita seus donos.

Vive com eles, morre com eles.

E tenta ser mais firme que o chão

que lhe sustenta no mundo.

O FIM

No fim tudo fica por ser,

por não viver, por desfazer.

O tempo apaga os atos,

os fatos, as necessidades...

Simplesmente, tudo se esquece,

deixa de ser.

Nada mais acontece.

Não há um depois.

O fim é apenas o fim.

O ULTIMO TEMPO DE UM CORPO

Reduzido a um corpo,

velho e cansado,

me despeço do futuro.

Sei a eternidade em um segundo

quase fora do mundo.

.

Descobrindo meu corpo,

como meu eu mais profundo.

O AMANHA NÃO É PARA SEMPRE

Tudo na vida

é efêmero, incerto,

e insignificante.

Tudo na vida morre

enquanto eternidades 

afogam futuros

no corpo de um  segundo morto.

O tempo é o incerto intervalo 

de um único e permanente instante

que se debate.

.

VIVER ATÉ QUANDO?

Viver até quando?

Talvez a vida não deva

durar tanto

diante de tamanho espanto.

Talvez, só a morte nos salve do mundo,

da angústia de ter nascido,

 crescido e vivido,

 entre tanto  tédio e  absurdo

Viver até quando?...

MEU CORPO É A MEDIDA DO MUNDO

Meu corpo é a medida do mundo,

da solidão e da ilusão de ser.

Meu corpo é biologia,

biografia, matéria viva,

devir, silêncio existência

e necessidade.

Meu corpo é meu limite

no tempo e no espaço.

É único e múltiplo.

É o definitivo lugar de todos os lugares.

A VIDA CONTINUA

As pessoas morrem, 

os lugares mudam, 

mas a vida sempre continua. 

Pouco importa o que foi

 ou o que será. 

 A vida continua

 através de tudo que passa,

acaba e desaparece.

A vida continua,

mas nada é permanente ,

nada é para sempre.

EXISTÊNCIA NEGATIVA

Não existo para os outros

 ou para o mundo. 

Muito menos para as coisas, 

Ideias e fatos 

que justificam meus atos. 

 Existo para ser ninguém, 

 para realizar o nada

no acontecimento de um corpo

 

ILUSÃO BIOGRÁFICA

Não importa a criança 

e o jovem que fui,

o adulto que me tornei

e o velho, que talvez,

algum dia eu serei.

Não importa nenhuma experiência 

ou memória dos meus  tempos de existência,

qualquer efemeridade biográfica.

Pois, tudo passa e se perde,

morre e desaparece,

sem deixar vestígio ou saudade.

O PASSADO ESTÁ MORTO

O passado está morto,

não importa a lembrança,

a saudade ou a herança.

Nada o fará ser de novo.

O passado está morto

e não há, para nós,

nenhuma esperança.

O futuro será sempre dos outros.

A MORTE QUE EU QUERO TER

Espero sobreviver

ao fim do mundo.

Ver desaparecer a civilização ocidental,

a cultura branca européia,

o industrialismo, 

o Estado moderno, nacional,

 o monoteísmo, o neo imperialismo,

e, por fim, toda distopia autoritária 

de inspiração fascista, stalinista

ou liberal.

Quero viver para morrer

em um outro mundo,

em uma nova terra,

hoje quase impossível

nas raias do inconcebível.